Subversão do debate político

A discussão política no espaço público deve permitir o debate aberto das ideias, com contributos de todos os interessados, suportado no livre acesso à informação, com a possibilidade de escrutinar publicamente as posições tomadas por todos os intervenientes e com formas alternativas de obter a informação. Estes princípios aumentam a possibilidade de termos um debate suportado na racionalidade.

A manutenção deste estado subversivo do debate e da informação ofuscada pelos apoiantes dos partidos que suportam o governo e formavam a coligação Portugal à Frente (PàF) contraria estes princípios em favor de uma maioria relativa do eleitorado que votou nessa coligação. Os resultados foram só claros ao indicarem qual o partido com mais mandatos na Assembleia da República, mas também foram claros ao não darem maioria absoluta.

Estes partidos continuam a atuar ignorando o passado, como se parte dos cidadãos eleitores não existissem e o Partido Socialista (PS) ainda estivesse no Governo em funções desde 2011. Mantiveram uma campanha de oposição a um PS que já não era Governo e de mascaramento dos números da sua governação, atuando ao nível da ocupação quase total do espaço mediático com a sua mensagem, roubando aos eleitores um princípio essencial do debate democrático.

O discurso político utilizado pela PàF tem sido o de medo dos mercados, o do ódio aos trabalhadores do Estado e de esmagamento de qualquer ideia que possa sequer pensar em defender uma rede de suporte social para aqueles que sejam menos afortunados na sociedade. Fazem-no, quer estejam em tempo de campanha, quer se encontrem em governação absolutista dos destinos do país ou, como agora, em que se debate a consensualização da forma de aplicar o poder de forma estável e duradoura, tal como é esperado dos partidos políticos.

Repetem sem parar os dogmas da sua doutrina como se se tratasse de factos explicáveis racionalmente. Fazem-no à exaustão para que uma mentira repetida muitas vezes acabe por se tornar algo que os cidadãos reconheçam como verdade. Desta vez procuram passar a ideia de que o PSD em minoria na Assembleia da República, sustentada pela abstenção ou aprovação pontual de medidas pelo PS, é a única forma de garantir um “tempo do compromisso” “estável e duradouro” como pediu o Presidente da República a Pedro Passos Coelho, quando decidiu convidá-lo a verificar se tinha condições para formar Governo.

O Presidente da República decidiu este convite recusando acusações de se substituir aos partidos políticos. Pois foi isso mesmo que fez ao não ouvir os partidos representados na Assembleia da República. Ao ignorar o art.º 187 da Constituição da República, o Presidente da República ignorou não só os partidos políticos, mas todos os cidadãos que os escolheram como seus legítimos representantes.

Por seu lado, Pedro Passos Coelho e os partidos que o apoiam voltaram aos jogos pueris das cartas enviadas ao PS. Enviam uma carta ao PS precisamente antes da saída do secretário-geral do PS para ser recebido pelo Presidente da República. Repetem as táticas subversivas de 2011 para se vitimizarem depois, seja qual for a decisão e argumentando que tudo fizeram.

O Presidente da República, o PSD e o CDS excluíram os legítimos representantes dos cidadãos que não votaram nestes dois partidos e coube ao PS aceitar o voto soberano e incluí-los no debate político de formação de um Governo duradouro para Portugal. O diálogo com todos os partidos políticos, aceitando a decisão soberana do povo ao eleger deputados de outros partidos, é a via democrática.

O que está aqui em causa não é se a PàF ganhou ou não as eleições legislativas de 2015 ou se o PSD é o partido com maior número de mandatos na Assembleia da República, mas se essa vitória dá ao Presidente da República e aos deputados do PSD, em coligação do CDS, a capacidade para suportar um Governo na Assembleia da República. O PS já disse no Acção Socialista Digital que perdeu as eleições legislativas de 2015. O que o PS nunca disse foi que tinha desistido de Portugal.

(Texto de opinião publicado no Acção Socialista – 15 de outubro de 2015)