Uma nova visão para a Europa

Se me perguntassem ontem sobre o futuro da Europa, iria dizer-vos que a herança dos últimos anos de Durão Barroso no eixo franco-alemão é pesada e deixou feridas difíceis de sarar nas populações dos vários países; que o discurso do atual governo não passa de uma cópia da narrativa alemã; que o futuro é cinzento e sem esperança porque aos cidadãos, jovens e velhos, já não interessa a Europa ou a política.

A minha participação na iniciativa Café Europa que decorreu há dias no ISCTE-IUL devolveu-me a esperança nos cidadãos europeus.

Sob a moderação e organização de um jornalista e a orientação de dos alunos do Doutoramento e Mestrado em Ciência Política do ISCTE-IUL e com as boas vindas de um professor universitário, falou-se na deliberação democrática e na representação dos cidadãos. Em torno de várias mesas de discussão, reuniram-se atores, desempregados, doutorandos, mestrandos e outros estudantes universitários.

Discutiu-se, mas não através do soundbyte ou com a agressividade que caracteriza hoje o debate político dos media. Discutiu-se no sentido nobre da construção e da formação das ideias de um projeto político. Tenho agora uma visão de futuro para a Europa que resulta das ideias que partilhei com os participantes no Café Europa.

Os fragmentos do diagnóstico e as propostas de solução estavam em todos os discursos dos participantes, desde a evolução dos tratados económicos até à Europa dos dias de hoje, sem esquecer que estes tratados foram conseguidos pela pacificação dos cidadãos através de medidas de redução das desigualdades. Nas propostas apresentadas, pediu-se mais participação nas decisões, maior transparência nas instituições e menos desigualdade entre todos os cidadãos de uma nova Europa.

Entendo que há hoje uma nova visão comum para a Europa que não passa só pelos indicadores económicos. Uma Europa que se projeta como ator mundial pela racionalidade e pelo suporte social às suas populações. A igualdade entre os cidadãos desta nova Europa irá manter a coesão e unidade interna que é a imagem que queremos projetar para o exterior. Só promovendo a imagem que criámos para nós próprios conseguiremos falar como uma Europa, a uma só voz.

(Texto de opinião publicado no Acção Socialista – 08 de abril de 2015)

Recebido no email: Acordo de Londres sobre as Dívidas Alemãs

Recebi isto no email. Concordo que não estamos a receber as mesmas condições. Talvez a história não esteja a ensinar nada aos atuais governantes da Europa.

Para que a memória não se apague. Fez no passado dia 27 de Fevereiro, 60 anos!
Acordo de Londres sobre as Dívidas Alemãs. Entre os países que perdoaram 50% da dívida alemã estão a Espanha, Grécia e Irlanda.

O Acordo de Londres de 1953 sobre a divida alemã foi assinado em 27 de Fevereiro, depois de duras negociações com representantes de 26 países, com especial relevância para os EUA, Holanda, Reino Unido e Suíça, onde estava concentrada a parte essencial da dívida.

A dívida total foi avaliada em 32 biliões de marcos, repartindo-se em partes iguais em dívida originada antes e após a II Guerra. Os EUA começaram por propor o perdão da dívida contraída após a II Guerra. Mas, perante a recusa dos outros credores, chegou-se a um compromisso. Foi perdoada cerca de 50% (Entre os países que perdoaram a dívida estão a Espanha, Grécia e Irlanda) da dívida e feito o reescalonamento da dívida restante para um período de 30 anos. Para uma parte da dívida este período foi ainda mais alongado. Esó em Outubro de 1990, dois dias depois da reunificação, o Governo emitiu obrigações para pagar a dívida contraída nos anos 1920.

O acordo de pagamento visou, não o curto prazo, mas antes procurouassegurar o crescimento económico do devedor e a sua capacidade efectiva de pagamento.

O acordo adoptou três princípios fundamentais:

  1. Perdão/redução substancial da dívida;
  2. Reescalonamento do prazo da dívida para um prazo longo;
  3. Condicionamento das prestações à capacidade de pagamento do devedor.

O pagamento devido em cada anonão pode exceder a capacidade da economia. Em caso de dificuldades, foi prevista a possibilidade de suspensão e de renegociação dos pagamentos. O valor dos montantes afectos ao serviço da dívida não poderia ser superior a 5% do valor das exportações. As taxas de juroforam moderadas, variando entre 0 e 5 %.

A grande preocupação foi gerar excedentes para possibilitar os pagamentos sem reduzir o consumo. Como ponto de partida, foi considerado inaceitável reduzir o consumo para pagar a dívida.

O pagamento foi escalonado entre 1953 e 1983. Entre 1953 e 1958 foi concedida a situação de carência durante a qual só se pagaram juros.

Outra característica especial do acordo de Londres de 1953, que não encontramos nos acordos de hoje, é que no acordo de Londres eram impostas também condições aos credores – e não só aos países endividados. Os países credores,obrigavam-se, na época, a garantirde forma duradoura, a capacidade negociadora e a fluidez económica da Alemanha.

Uma parte fundamental deste acordo foi que o pagamento da dívida deveria ser feito somente com o superavit da balança comercial. 0 que, “trocando por miúdos”, significava que a RFA só era obrigada a pagar o serviço da dívida quando conseguisse um saldo de dívisas através de um excedente na exportação, pelo que o Governo alemão não precisava de utilizar as suas reservas cambiais.

EM CONTRAPARTIDA, os credores obrigavam-se também a permitir um superavit na balança comercial com a RFA – concedendo à Alemanha o direito de, segundo as suas necessidades, levantar barreiras unilaterais às importações que a prejudicassem.

Hoje, pelo contrário, os países do Sul são obrigados a pagar o serviço da dívida sem que seja levado em conta o défice crónico das suas balanças comerciais

Marcos Romão, jornalista e sociólogo. 27 de Fevereiro de 2013.